quinta-feira, fevereiro 19, 2009

Talhantes e Trovadores


(adoro a plaquinha, reparem: "fresh brains every day")

Faz-me espécie a crítica acrítica.

Aqueles textos tão comuns nas revistas de arquitectura, que se dizem críticos, mas que de crítica têm muito pouco.

Em que os autores parecem empenhados em verter para palavras os amanhãs que os tijolos cantam.

Geralmente fazem-no com palavras caras, mas ideias vagas... preocupados, dir-se-ia, em justificar com frases complicadas as colunas de texto que lhes pagam para ocupar... porque meter só fotografias parecia mal... e porque alguém acha que um registo daqueles dá sempre cachet a uma revista (no pressuposto, claro, de que os bois gostam mesmo de olhar para palácios).

Esta crítica está hoje na moda.

Para além da linguagem, tem uma outra particularidade: só fala do que gosta. Os autores nunca saem da sua zona de conforto para apontar defeitos ou insuficiências a projectos de colegas com nome.

É o permanente elogio das vacas sagradas. É a crítica dos Trovadores.

Faz falta outro género: a crítica dos talhantes.

O crítico talhante pega na vaca sagrada e... bem... estão a ver onde quero chegar: lombo, alcatra, etc.

Quando talha, é sem maldade. Não é nada de pessoal. Mas é talhada a sério. Com coisas concretas.

O átrio enorme, onde o piso claro reflecte a luz solar e cega os visitantes.

O bar com tanta superfície clean, bem lisinha, tão boa para reflectir o som, que o barulho da máquina do café não deixa ninguém falar.
(tum-tum-tum... tic-tic... katchac... bjééééé...
...tum-tum-tum... tic-tic... katchac... bjééééé...
...tum-tum-tum... tic-tic... katchac... bjééééé...)


A sinalética do hospital, que é miserável e aflige os visitantes.
(«pijo 2 xála 3 pont 7? ai 'nha noxa xenhora! num bejo as letrinhas das placas»)

O recreio da escola primária, recoberto de alcatrão, borracha e polvihlado com baloiços e escorregas, sem verde, sem sombra, ao contrário de tudo o que hoje os especialistas em desenvolvimento infantil aconselham.
(mas com cores berrantes, o que certamente compensa...?)

Tanta ponta por onde pegar...

Se não nos ficarmos pela discussão do aspecto...

Se nos lembrarmos que os edifícios da moda, embora desertos nas revistas, têm gente no dia-a-dia...