6. Remuneração dos Estagiários

Primeiro, porque o estágio não deve ser um “serviço militar obrigatório”, que castiga com um ano de serviço gratuito os novos recrutas. É perverso obrigar (porque ele é de facto obrigatório, não esqueçamos!) as pessoas a um ano de trabalho gratuito.
Segundo, porque inundar um mercado com trabalho de mão-de-obra gratuita é desregulá-lo. E essa desregulação prejudica todos: estagiários, arquitectos sem vínculo (nomeadamente os que estão em início de carreira, que ficam com poucas ou nenhumas hipóteses de continuar) e todos os restantes, também, que passam a trabalhar num mercado ainda mais desregulado ao nível dos honorários.
A Ordem não pode, ao mesmo tempo, gerar mão-de-obra gratuita e querer qualificar a Arquitectura. Esta é uma contradição fundamental – e não é o mercado que a pode resolver. Haverá soluções exequíveis e razoáveis? Haverá, certamente – mas só as conseguiremos encontrar depois de assumir que isto é um problema que temos de resolver.
6 Comments:
Sobre isto, sabemos os dois, que sempre nos batemos do mesmo lado...
Sim, é verdade. O que me parece aqui importante sublinhar é o seguinte: devemos começar por assumir que há um problema.
E é com base nessa assunção que deveremos, depois, procurar soluções - que podem ser simples ou complexas, limitadas ou abrangentes, audaciosas ou comedidas, directas ou indirectas, totais ou parciais, imediatas ou diferidas.
Poderia a Ordem assumir o papel de entidade intermediária, pagando aos estagiários um valor básico, por um lado, e recebendo, por outro lado, do Estado e dos privados interessados, um valor também básico?
Poderiam alguns estagiários, por sua escolha, preferir trabalhar sem remuneração, em condições especiais? Quais?
Para resolver um problema é preciso, afinal, duas coisas: uma mente aberta... e um problema conhecido.
Não poderia estar mais de acordo há que remunerar todos os que trabalham. A questão não é só os estagiários mas todos aqueles que já exercem há muito e são dispensados para os gabinetes albergarem cada vez mais novas fornadas de recém-licenciados. E um ciclo vicioso que nos foi imposto pelos actuais dirigentes, que só beneficiou os grandes gabinetes, i wonder why?, e como causa aumentou o número de desempregados. O mais caricato é que existe um subsidio do IEFP que ninguém aproveita. Talvez uma das formas de salvaguardar estagiários e os já profissionais seria apenas permitir a aceitação de estagiários de dois em dois anos, o que obrigaria os gabinetes a empregar profissionais nos anos em que não podiam ser patronos.
Há que assegurar o estágio e o emprego.
Margarida Santos
Cara Margarida Santos,
O espaçamento a dois anos parece uma ideia interessante - nunca tinha pensado.
Também a possibilidade de um patrono ter cinco estagiários me parece exagerada.
Primeiro, ter cinco pessoas em simultâneo pode comprometer uma boa supervisão.
Segundo, porque estamos a falar de uma classe que já deve ter mais de 10.000 potenciais patronos.
Em relação ao IEFP: é verdade, e aí está uma matéria em que a Ordem poderia ser muito útil: na negociação com o Estado, e nos procedimentos administrativos.
Lá está - só assumindo o problema é que podemos encontrar (e criar) possíveis respostas. Porque elas existem.
Caro Pedro:
Vamos ser realistas, pois muito bem sabemos que patronos, no sentido lato da palavra são muito poucos, os estagiários pouco aprendem mas muito trabalham como desenhadores.
O que actualmente existe é um mercado de fast-workers com uma durabilidade máxima de 12 meses, aonde se aplica a já abolida lei da escravatura. O que mais me choca neste assunto, que para muitos é tabu, é ser efeito domino e não afecta apenas os recém licenciados. Ao existirem trabalhadores não remunerados, implica a dispensa de outros colaboradores e variação no valor dos honorários de um projecto qualquer. Como pode um gabinete, que remunera os seus colaboradores, pedir o mesmo valor de honorários que um outro gabinete aonde se exerce o estágio gratuito? Mais um ponto para desiquilibrar, a utopia de um mercado justo.
E igualmente concordo que cinco estagiários é excessivo para um patrono, mas se bem conheço a mentalidade portuguesa logo haveria mil e uma maneiras de contornar a situação e dentro de um gabinete haveria muitos patronos.
Provavelmente também deveria de existir uma fiscalização a quem se propõe a ser patrono.
Margarida Santos
Olá outra vez, Margarida :)
sinteticamente, ponto a ponto:
"vamos ser realistas" - Expressão interessante, mas que se torna perversa quando nos impede de raciocinar. Ouço-a muitas vezes quando se fala de remuneração de estagiários... Ora, há irrealistas, mas esses são os que não têm noção da gravidade do que se está a passar.
"trabalho como desenhadores, tabu, efeito dominó, dispensa de outros colaboradores..." - concordo a 1000%, tirou-me as palavras da boca.
"utopia de um mercado justo" - Não gosto do termo "utopia", porque o que está aqui em causa é uma obrigação básica, perfeitamente ao alcance da Ordem.
Também não gosto da expressão "mercado justo", porque não é preciso ir tão longe - o que está aqui em causa é a mais elementar regulação.
Acxho que todos nós temos de ter uma atitude realista e pragmática em relação aos problemas da profissão, ou seja: sem tabus, assumindo os problemas que existem e procurando soluções concretas.
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